Show do Now United prova que o TikTok e as dancinhas vão dominar a música

O Now United é a aposta do produtor britânico Simon Fuller, que criou as Spice Girls e descobriu Amy Winehouse, para a geração alpha -aquela que nasceu a partir dos anos 2010 e chama de "cringe" os millennials, nascidos nos anos 1980 e 1990.


Por Folhapress Publicado 22/03/2022
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Reprodução: Instagram

Antes de subirem ao palco, eles surgem no telão em um vídeo pré-gravado para ensinar a coreografia de um dos hits que vão cantar dali a pouco. “É só desenhar ondinhas com as mãos para a direita e para a esquerda, e depois imitar a onda com o corpo todo”, diz a sul-coreana Jeong HeYoon ao lado do canadense Josh Kyle e da brasileira Any Gabrielly às 10 mil crianças que reproduzem os movimentos das arquibancadas do ginásio do Ibirapuera, em São Paulo.


A lição do trio dá o tom de como será o show do Now United, uma banda com 15 integrantes de 15 países diferentes -um número maior do que a idade da maioria dos fãs, tendo em vista o público que compareceu ao primeiro dos três shows que o grupo faz na capital paulista neste fim de semana antes de seguir viagem para Brasília, Rio de Janeiro e Recife.


O Now United é a aposta do produtor britânico Simon Fuller, que criou as Spice Girls e descobriu Amy Winehouse, para a geração alpha -aquela que nasceu a partir dos anos 2010 e chama de “cringe” os millennials, nascidos nos anos 1980 e 1990.


Prestes a completar cinco anos, o Now United nunca lançou um álbum nem conseguiu emplacar nas paradas nenhuma de suas dezenas de músicas, mas o show mostra que talvez isso não seja tão importante para Fuller, que investe pesado na contratação de coreógrafos como Kyle Hanagami, que já trabalhou com Britney Spears e Jennifer Lopez, além de Blackpink e BTS. O grupo tem direito até a um time de dublês que testam as coreografias para depois ensinar aos ídolos.


Das arquibancadas do ginásio do Ibirapuera, que não tem a melhor das acústicas, não é possível compreender com precisão tudo que os integrantes da banda dizem aos fãs nem as letras de algumas de suas músicas, que, com uma sonoridade eletrônica e batidas marcadas, são carregadas de mensagens positivas e de refrões chicletes como “zumba, zumba, zumba ya yeah” ou “paraná, eh”.


Mas, novamente, talvez isso não seja tão importante. Mesmo sem cantar a maior parte das canções -por não saberem as letras ou, mais provavelmente, por não as escutarem com precisão-, o público se levanta das cadeiras, aqueles com menos de um metro sobem em cima delas, e reproduzem com maestria as dancinhas.


Não é possível saber se, noutros países, o público se comporta da mesma maneira. As plataformas de streaming de música estimam que mais de dois terços da audiência do Now United seja do Brasil, embora os integrantes do grupo venham de todos os continentes.


Prova disso é que um dos principais contratos de publicidade do grupo, com uma marca de desodorante, só tem validade no Brasil. Os destinos da turnê também evidenciam a torcida verde e amarela, já que, dos 13 shows marcados até o momento, 11 ocorrem no Brasil. Os outros dois, marcados para o início de abril, serão em Portugal.


O preço do último lote dos ingressos para as apresentações em São Paulo vai de R$ 500 a quase R$ 900. Como a maioria dos fãs não têm idade para irem sozinhos, o show acaba por ser um programa familiar.


Carregando na fila uma placa de papelão com o símbolo da banda adornado por luzes de LED, a professora Priscila Santos e o bancário Daniel Carvalho contam que desembolsaram R$ 2.000 para levar as filhas Lavínia, de 10 anos, e Milena, de 12, à apresentação.


“Compramos os ingressos no primeiro dia. Assim que as vendas abriram, eu estava lá. Se não comprasse, não ia poder nem voltar para casa”, diz o pai, entre risos. “Gastamos bastante dinheiro, mas me senti realizada por poder realizar um dos sonhos das minhas filhas. Elas são tão apaixonadas que aprendemos todas as coreografias por osmose”, acrescenta a mãe.


A estratégia por trás da banda deu tão certo que Fuller criou em fevereiro um segundo grupo aos mesmos moldes. É o The Future X, formado por sete jovens americanos e canadenses contratados a partir de audições feitas no TikTok.


É pelos vídeos do aplicativo que a banda, que vive junto numa mansão em Malibu, na Califórnia, mostra sua rotina como se estivesse num “BBB” para se apresentar aos fãs do irmão mais velho e, quem sabe, abocanhar os mesmos fãs.


A presença de palco é a mesma. Ao abrir os shows do Now United, o grupo dança enquanto os telões exibem vídeos que parecem ter saído do aplicativo para ensinar as coreografias aos novos fãs.


Os novatos são recebidos com os mesmos gritos estridentes que as crianças dão para celebrar o Now United, mas passam despercebidos entre as cadeiras e as arquibancadas durante o show principal.


Os olhos de todos, afinal, estão voltados apenas para as coreografias que tomam o palco e os telões. É a prova de que as dancinhas que viralizaram na pandemia vão dominar a música -isto é, se já não o fizeram.