Conheça a rotina de dublês da vida real em ‘Cara e Coragem’, nova novela da Globo

Pat e Moa são vividos por Paolla Oliveira e Marcelo Serrado, que dividem o protagonismo do enredo com os seus dublês da vida real.


Por Folhapress Publicado 30/05/2022
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Reprodução: TV Globo

Clarice Gusmão, diretora da Companhia Siderúrgica Gusmão, contrata os dublês Pat e Moa para achar uma pasta, contendo a fórmula secreta de uma substância que vale uma fortuna. Misteriosamente, Clarice morre. Na calada da noite, os dublês invadem a sede da empresa, para procurar pistas da substância. De repente, soa um alarme, e a equipe de seguranças inicia a perseguição aos invasores, que escapam pela janela.


A cena faz parte de “Cara e Coragem”, nova novela da faixa das sete, que estreia na TV Globo nesta segunda-feira (30). Escrita por Claudia Souto e dirigida por Natalia Grimberg, a trama desloca os holofotes para os dublês -ou os dublês dos dublês. “A temática é a coragem. Desde a microcoragem para romper uma relação, até a macrocoragem que é fazer do seu risco a profissão”, afirma Souto.


Para invadir a siderúrgica, Roberta Felipe, de 36 anos, e Max Gabriel, de 37 anos, desceram, numa noite de fevereiro, da cobertura de um prédio de 70 metros de altura, no Santo Cristo, região central do Rio de Janeiro.


“Ali se a gente caísse, não teria jeito, era saco preto direto”, diz Felipe, rindo. A fuga foi feita pela janela, com uma descida de rapel vertiginosa. Durante a gravação, olhar para baixo não era, de fato, uma boa ideia. Fora o breu, todo o controle de movimentos estava nas mãos dos dublês. Com 19 anos de profissão, Gabriel conta que nunca tinha participado de uma cena tão perigosa numa novela.


Pat e Moa são vividos por Paolla Oliveira e Marcelo Serrado, que dividem o protagonismo do enredo com os seus dublês da vida real. Por isso, as filmagens de “Cara e Coragem” têm exigido cenas de alto risco aos atores, a ponto de Felipe e Gabriel estarem durante todo o tempo no estúdio, em caso de necessidade.


Não por acaso, o convívio entre dublês e atores permite um intercâmbio de experiências. Se Felipe e Gabriel imitam os trejeitos de Oliveira e Serrado, os artistas se engajam nos papéis, assumindo mais riscos do que o habitual. Os atores se animaram em voar de paraquedas e, para o primeiro episódio, toparam pular de contêineres de dez metros de altura.


Coube ao departamento de efeitos especiais da emissora desenvolver as mais diversas geringonças usadas pelo quarteto. Uma delas emulou um comercial de creme dental, em que Pat e Moa aparecem como se fossem super-heróis.


Desse jeito, com as mãos apontando para o infinito, eles voam presos a uma estrutura verde-limão, que lembra algo entre um aparelho de ginástica para idosos e um instrumento de tortura medieval. Antes da edição, a equipe faz tomadas tanto dos dublês quanto dos dublês dos dublês, para que a cena fique o mais real possível.


O mesmo ocorre com o cabo de aço, que preso ao abdômen de cada personagem, simula o impacto de um soco poderoso, capaz de arremessar uma pessoa a metros distância, como nos filmes do mestre das artes marciais Jackie Chan. O impacto é amortecido por colchões, posicionados para evitar algum desastre.


Há também as cenas de pura pancadaria. Socos e chutes não atingem os atores, que gemem como tenistas de Roland Garros, simulando a um só tempo força e dor. Há 17 anos no ramo, Felipe está acostumada com cenas de barraco. Foi ela que em, há dez anos, substituiu Adriana Esteves no papel de Carminha, em “Avenida Brasil”.


Em outro trabalho, ela viveu Clara, personagem de Bianca Bin em “O Outro Lado do Paraíso”, de cinco anos atrás. Filmada no mar de Arraial do Cabo, no litoral fluminense, a oito metros de profundidade, a cena mostrava a mocinha tentando escapar de um caixão, onde havia sido trancada viva. Eis que surge um tubarão no ponto em que as filmagens seriam feitas.


“Eu não tinha oxigênio, prendia toda a respiração. Caso fizesse um sinal, toda a equipe me salvaria. Depois do tubarão, o capitão do barco ainda ficava assim ‘olha lá que bonitinho, agora acho que apareceu a ‘tubaroa'”, lembra.


Segundo Gabriel, a cena mais dolorosa ocorreu ainda no início da carreira, quando caiu de dez metros de altura. A queda seria amortecida por um colchão de ar, mas, à época, um diretor “muy amigo” pediu para dar uma apimentada, propondo que o dublê fizesse movimentos no ar, quase como Daiane dos Santos.


Ele sentiu dor, mas não parecia ter se machucado, até ter uma ótima ideia. “Assim que a cena acabou, fui para a academia treinar. Quando cheguei para malhar peito, na posição de crucifixo, senti um estalo. Tinha quebrado a costela”, diz.


Pela primeira vez juntos em uma novela, a dupla conta que os dublês de ação não devem parecer com os atores. Para as filmagens, toda a equipe de caracterização os aproxima fisicamente dos artistas representados.


Felipe, porém, é confundida com Oliveira. A última vez aconteceu numa festa no Carnaval carioca, em que usava um vestido preto similar ao da atriz. De repente, uma fã gritou “olha lá a Paolla!”. “Quando eu virei e disse ‘oi’, vi a maior cara de decepção da minha vida.”


Ela descarta a possibilidade de se passar por Oliveira em baladas, aproveitando a fama e o glamour da atriz. “Não dá para chegar para o dono da festa e dizer ‘oi, eu sou a Paolla’. Ele vai dizer ‘oi, e eu sou o Chico Mendes.”


Vestindo um macacão verde-musgo tipo “Kill Bill”, Oliveira, espichada num sofá dos estúdios, destaca a modernidade da sua primeira novela das sete, que traz novos modelos de família e uma representatividade negra pouco vista na TV brasileira.


“As pessoas adoram bastidores, a gente perdeu um programa que eu amava, o ‘Vídeo Show’. A gente sabe que isso vende, a metalinguagem é engraçada e isso é o diferencial dessa novela”, ela afirma. “Os dublês são pessoas feitas para não aparecer.”


A atriz, que se declara uma pessoa orientada pela dimensão física da vida, diz já ter tido o preparo exigido pela novela antes do início das gravações. Já Serrado começou a fazer aulas de ginástica para chegar à forma ideal.


“Sempre fiquei muito intrigado com o trabalho dessa gente, eles fazem algo incrível. Nós dois fizemos um curso básico de dublê, mas agora estamos numa espécie de pós-graduação”, ele conta.


Felipe e Gabriel dizem que vivem da profissão, embora não haja regulamentação ou salário fixo.

Ganham conforme a quantidade e a periculosidade das cenas. Perguntada se se tornou milionária com “Cara e Coragem”, Felipe faz planos para o próximo investimento. “Estou pensando em comprar um jatinho.”