Magic Johnson, 60, ajudou a quebrar estigma do HIV

Nesta quarta (14), ao completar 60 anos, Earvin "Magic" Johnson Jr. continua o soropositivo mais famoso do mundo e segue com as relações, ultimamente controversas, com seu time do coração, o Lakers.


Por Folhapress Publicado 14/08/2019
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Reprodução (Divulgação)

Há quase 28 anos anos, um dos maiores jogadores da história da NBA anunciava ao mundo que havia contraído o vírus HIV e estava se aposentando das quadras no auge, aos 32 anos o astro, contudo, acabou voltando a jogar.

Na época, o diagnóstico era quase uma sentença de morte e considerado por muitos um “câncer gay”. Cazuza havia morrido um ano antes; Freddie Mercury, duas semanas após o anúncio de Magic Johnson.

Nesta quarta (14), ao completar 60 anos, Earvin “Magic” Johnson Jr. continua o soropositivo mais famoso do mundo e segue com as relações, ultimamente controversas, com seu time do coração, o Lakers.

Para comemorar mais um ano, ele está de férias com amigos e família num iate pela Costa Amalfitana, na Itália.

A longevidade do ex-jogador não tem nada de “magic”. Pacientes com HIV ou Aids, a doença causada pelo vírus que ataca o sistema imunológico, passaram a viver mais tempo e com mais saúde a partir de meados dos anos 1990, graças à evolução dos remédios.

“No começo, foram tempos muito tristes. Médicos, como eu, iam em funerais de pacientes toda semana”, diz à reportagem o especialista em doenças infecciosas Dean Winslow, professor da Universidade Stanford, na Califórnia, que desde 1981 atende pessoas com HIV/Aids.

“Ocasionalmente tínhamos médicos ou enfermeiras que se negavam a tratar pacientes com Aids. Ninguém sabia ainda o que causava o vírus, como era transmitido.”

Foi numa manhã de novembro de 1991 que o então armador do Lakers enfrentou jornalistas e câmeras de TV para fazer seu anúncio. Ao seu lado, o dono do time, Jerry Buss, e Kareem Abdul Jabbar, colega de quadra aposentado e uma das lendas do basquete.

Meses antes, Johnson havia se casado com Earlitha “Cookie” Kelly, com quem vive até hoje. Ela não fora infectada, nem o filho do qual estava grávida, E.J. Johnson.

O médico se lembra bem do susto com o anúncio de Johnson, ganhador de cinco títulos da NBA e eleito melhor jogador da liga por três temporadas. “Foi muito corajoso e também muito útil para tirar o estigma e alertar que HIV não ocorria só em gays ou usuários de drogas injetáveis”, diz Winslow.

Numa entrevista à revista Sports Illustrated, Johnson afirmou que havia sido infectado por relações sexuais sem proteção, mas não sabia com quem nem quando. O diagnóstico surgiu em exames de rotina para a pré-temporada da NBA.

“Antes de ser casado, tive uma vida movimentada de solteiro”, disse Johnson, negando qualquer relação homossexual. “Confesso que, ao chegar em Los Angeles, em 1979, fiz meu melhor para acolher todas as mulheres que podia, e a maioria por meio de sexo sem proteção.”

O primeiro tratamento contra HIV/Aids foi aprovado em 1987, seis anos após a descoberta do vírus, quando milhares já haviam morrido e outros milhões estavam infectados. Pouco se sabia sobre a eficácia da droga AZT, mas seus efeitos colaterais eram devastadores.

Só em 1996 uma combinação de drogas anti-HIV começou a mudar o jogo. Ainda assim, pacientes precisavam de punhados de pílulas duas ou três vezes ao dia, às vezes com restrições de alimentação.

No fim da década, a terapia já estava mais refinada e os efeitos adversos aliviados. Hoje, muitos soropositivos tomam só uma ou duas pílulas ao dia.

Winslow diz que hoje a doença é manejável, com expectativa de vida praticamente igual aos dos não soropositivos. “Agora temos o luxo de poder nos preocupar com problemas com os quais não era possível se preocupar antes, como pressão alta e diabetes.”

Johnson teve acesso ao coquetel de drogas em 1994 –um ano e meio antes de chegar ao público– em testes clínicos com ajuda de seu médico, David Ho, pioneiro em tratamentos com antirretrovirais.

Numa entrevista em 2011, Ho afirmou que a rotina de Johnson incluía Trizivir –composto por AZT, 3TC e Ziagen, que impede o vírus de alterar a célula–, e Kaletra –dois inibidores de protease (bloqueiam a reprodução).

Hoje, existem dezenas de drogas, até as que impedem a transmissão, como a PrEP, tomada diariamente –recentemente a OMS (Organização Mundial da Saúde), com base em pesquisas, disse que a pílula não precisa ser diária– por quem é HIV-negativo.

Segundo Ho disse à revista Newsweek, Johnson é o exemplo de que é possível ter uma vida saudável apesar do HIV. Ele afirmou que só conversava com o ex-atleta para checar se ele continuava tomando os remédios no mesmo horário todos os dias. “É um desafio porque ele é muito ocupado.”

A OMS afirma que 38 milhões de pessoas vivem com HIV/Aids. Em 2018, 770 mil morreram de complicações relacionadas ao vírus, contra 1,4 milhão em 2000.
Para Johnson, os cinco primeiros anos após o anúncio foram os mais difíceis, não só pelos tratamentos erráticos, mas pelo jeito que foi recebido nas quadras quando decidiu voltar, um ano depois.

Colegas reclamaram com medo de ser infectados. Em 1992, o armador recebeu o prêmio de jogador mais valioso do Jogo das Estrelas e trouxe para casa a medalha de ouro das Olimpíadas de Barcelona.

Fora das quadras, Johnson virou ativista na prevenção do HIV/Aids. Nos negócios, virou um dos ex-atletas da NBA mais bem sucedidos, com investimentos em marcas como Starbucks e Burger King em bairros pobres, e participação em times esportivos, como Dodgers (beisebol), Sparks (basquete feminino), Los Angeles Football Club (futebol) e Team Liquid (e-sports).

O Lakers sempre foi parte importante na vida de Johnson. Em 2019, porém, outra etapa foi encerrada. Após dois anos como presidente, se demitiu em abril.

“O que estou fazendo? Tenho uma vida ótima. Vou voltar pra essa minha vida ótima”, disse a jornalistas ao anunciar a demissão, cansado dos dramas de bastidores da empresa. “Gosto de ser livre.”